
Genética na Comunidade
Anatomia e função do sistema reprodutor masculino Ana Paula Lechetta e Michelle Susin

Figura 1: Representação das estruturas internas do sistema reprodutor masculino. Ducto deferente, Testículo, Túbulo Seminífero, Septos Testiculares, Túnica Albugínea, Epidídimo, Escroto.

Testículos: representam as gônadas masculinas, são estruturas pares glandulares fundamentais para a fertilidade masculino, devido a sua função, produtora de hormônios e espermatozoides. Se desenvolvem na cavidade abdominal durante a vida intrauterina e durante o último trimestre de gestação descem para a bolsa escrotal, onde ficam definitivamente alojados. Apresentam normalmente 40 cm³ de volume e são organizados através de túbulos denominados túbulos seminíferos.
O testículo é envolvido por uma cápsula de tecido conjuntivo, denominado túnica albugínea, de onde partem os lóbulos testiculares. O tecido testicular é constituído por cerca de duzentos a trezentos lóbulos, que são separados por septos de tecido conectivo. Cada lóbulo contém entre dois e três túbulos seminíferos, local em que os espermatozoides e hormônios sexuais são produzidos. Os túbulos convergem na região posterior do testículo e sua produção é liberada para a rede testicular.
Cada lóbulo possui túbulos seminíferos que representam 85% da massa testicular.
Túbulos seminíferos: O túbulo seminífero (Figura 2) consiste em um lúmen central revestido por um epitélio seminífero formado por dois tipos de células (1) células de Sertolli e (2) as células de linhagem espermatogênica (espermatogônias, espermatócitos e espermátides).
O epitélio seminífero (Figura 2) é envolto por uma membrana basal e uma parede (túnica própria) formada por fibras colágenas, fibroblastos e células contráteis, que impulsionam os espermatozoides adiante.
O espaço entre os túbulos seminíferos é ocupado por vasos sanguíneos, responsáveis pela nutrição do tecido, canais linfáticos, e agrupamentos de células de Leydig, produtoras de testosterona. É através do lúmen que as substâncias produzidas no tecido testicular, como a testosterona, serão liberadas para a corrente sanguínea.
Figura 2. Representação de corte do tecido do túbulo seminífero, indicando a sua organização e divisão: Lúmen; Epitélio seminífero (formado pelas Células de Sertoli e espermatogênicas); túnica própria; espaço intertubular (formado pelas células de Leydig e vasos).
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Células de Sertoli: formam as paredes dos túbulos seminíferos, realizam a sustentação, proteção e nutrição das células relacionadas a espermatogênese. Atuam como células de ligação entre o espaço intertubular e o lúmen do túbulo seminífero (Figura 3). São as células responsáveis pela produção do hormônio inibina e pela conversão da testosterona, produzida pela célula de Leydig, em estrogênio e desidrotestosterona. Durante o período embrionário, as células de Sertoli também produzem o fator inibitório mulleriano (MIF), fundamental para a diferenciação das estruturas do feto em órgãos sexuais masculinos.
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Células de Leydig: presentes no tecido que envolve os túbulos do testículo, são produtoras da testosterona, estradiol e di-hidrotestosterona (DHT). As células de Leydig maduras são encontradas normalmente nos testículos de bebês do sexo masculino, durante poucas semanas após o nascimento, desaparecendo até a idade de 10 anos, aproximadamente. Elas são novamente ativadas no início da puberdade masculina.

Figura 3. Representação da estrutura e componentes do do túbulo seminífero. Célula de leydig. Espermatozoide. Célula de Sertoli. Espermatócitos I e II. Espermatogônia. Membrana basal.
Epidídimo: consistem em 2 órgãos, que estão aderidos lateralmente à margem posterior dos testículos e é o local de maturação e armazenamento dos espermatozoides.
Canal ou Ducto deferente (Figura 1): é a porção final do epidídimo, por onde são liberados os espermatozoides maduros que estavam armazenados.
Vesículas seminais (Figura 4): localizadas acima da próstata , são estruturas pares, que também atuam na secreção do sêmen, em especial de substâncias alcalinas, que garantem a sobrevivência dos espermatozoides.
Próstata: é classificada como glândula sexual acessória, envolvida no processo de secreção da porção líquida do sêmen. Seu tamanho varia ao longo do período de desenvolvimento do homem, e possíveis anormalidades em seu volume podem sinalizar patologias e/ou alterações hormonais. A principal função da próstata é armazenar e secretar o líquido prostático, que faz parte do sêmen,
Uretra: canal condutor, que possui a função de conduzir e expelir o esperma durante o processo de ejaculação.
Pênis (Figura 4): formado por tecido erétil – denominado corpos cavernosos e esponjosos, muito vascularizada. É onde se encontra a uretra, estrutura que permite a passagem da urina e do sêmen, pelo óstio externo da uretra. A extremidade é formada por uma região levemente dilatada, denominada glande, recoberta pelo prepúcio.
Glândulas bulbouretrais (Figura 4): localizadas bilateralmente abaixo da próstata, contribui para a produção do sêmen e, também na lubrificação do pênis durante o ato sexual.

Figura 4: Representação das estruturas internas e externas do sistema reprodutor masculino. Vesícula Seminal, Próstata, Glândula Bulbouretral, Corpo Esponjoso, Corpo Cavernoso, Pênis, Testículo, Uretra, Epidídimo, Ducto Deferente.
As estruturas do sistema reprodutor masculino podem ser classificadas de acordo com sua localização anatômica:
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Órgãos sexuais internos: testículos, epidídimos, ductos deferentes, glândulas seminais, uretra, próstata e glândulas bulbouretrais (Figura 1)
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Orgão sexuais externos: pênis, porção distal da uretra e escroto
Escroto: consiste em uma bolsa fibromuscular, que reveste e protege os testículos e as estruturas a ele associadas (Figura 1).
Principais hormônios que atuam no sistema reprodutor masculino
Hormônios gonadotrópicos: Hormônio Luteinizante (LH) e Hormônio Folículo estimulante (FSH): exercem seus efeitos sobre os testículos e ovários. Nos testículos agem sobre as células de Sertoli e as células de Leydig, estimulando a síntese de hormônios sexuais.
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LH age estimulando as células de Leydig a produzir testosterona.
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FSH age estimulando as células de Sertoli a realizar espermatogênese, processo de formação dos espermatozoides.
TESTOSTERONA: A testosterona é um hormônio sexual classificado com andrógeno, devido a sua estrutura molecular, produzida pelas células de Leydig, situadas nos túbulos seminíferos dos testículos. Após a secreção da testosterona, ela é ligada à albumina que permite sua circulação no sangue. A maior parte da testosterona que se fixa nos tecidos do corpo é convertida, pelas células do tecido, em di-hidrotestosterona e estradiol, como no caso da próstata.
INIBINA: produzida e liberada pelas células de Sertoli, em resposta à estimulação do FSH. Sua principal função consiste em suprimir a secreção hipofisária de FSH (Figura 5). A ativina é um hormônio que também atua nesse processo, tendo papel antagonista, ou seja, função oposta ao da inibina.
A regulação dos hormônios que atuam no sexo masculino - Sistema hipotálamo-hipófise
Os principais hormônios que atuam no sexo masculino e determinantes no desenvolvimento das características e função reprodutiva masculina, são regulados entre si por meio de um esquema de feedback negativo e positivo. Basicamente, a cascata de controle se inicia pela secreção do hormônio liberador de gonadotrofina (GnRH) pelo hipotálamo, que estimula a hipófise anterior a secretar os hormônios: luteinizante (LH) e folículo estimulante (FSH). O LH é o estímulo para a secreção de testosterona pelas células de Leydig, presentes no testículo, enquanto, o FSH estimula, principalmente a espermatogênese, realizada pelas células de Sertoli e estimulada pela testosterona (Figura 5).

Figura 5: Representação esquematica da regulação dos hormônios atuam no desenvolvimento do sexo masculino – Sistema Hipotálamo-Hipofisário :
(a) hormônio liberador de gonadotrofina (GnRH), produzido pelo hipotálamo, estimula a secreção de hormônios pela hipófise anterior; (b) a hipófise anterior, estimulada pelo hormônio liberador de gonadotrofina (GnRH), produz os hormônios luteinizante (LH) e folículo estimulante (FSH); (c) os hormônios produzidos pela hipófise estimulam as células de Leydig e Sertoli, que estão envolvidas na produção de testosterona e espermatogênese, respectivamente; (d) a testosterona, produzida pelas células de Leydig, quando em níveis elevados, inibe a ação do hipotálamo e da hipófise (e); (f) a inibina, hormônio produzido pelas células de Sertoli também é responsável por inibir a ação ada hipófise.
Essa cascata é, ao mesmo tempo, regulada por meio de diversos feedbacks negativos e positivos. Os mais importantes são:
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Inibição produzida pela Inibina: a inibina é um hormônio produzido pelas células de Sertoli e inibe a secreção dos hormônios produzidos pela hipófise anterior (LH e FSH), quando há aumento da espermatogênese (realizada pelas células de Sertoli). O resultado desse feedback é a diminuição da secreção de FSH e LH (Figura 5).
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Inibição de LH e FSH pela testosterona: a testosterona secretada em resposta ao LH, tem o efeito de inibir a secreção de LH pela hipófise, de forma direta ou indireta, por meio da inibição da produção de GnRH pelo hipotálamo (Figura 6).

Figura 6: Representação do esquema de feedback negativo: inibição de hormônio luteinizante (LH), GnRH (hormônio liberador de gonadotrofina) e folículo estimulante (FSH) pelo aumento do nível de testosterona no sangue.

Figura 7: Comparação dos mecanismos regulatórios hormonais no sistema reprodutor masculino entre indivíduos normais e portadores da Síndrome de Klinefelter. Apesar do estímulo, proveniente do FSH e LH, para produção de testosterona, o testículo não realiza essa produção de forma adequada.
No caso de ausência/falha na produção de algum desses hormônios, a cascata por inteiro é prejudicada, assim como as funções de cada molécula nela presente. Os indivíduos com Síndrome de Klinefelter apresentam essa cascata prejudicada, pois devido a falha na produção de testosterona o mecanismo de feedback negativo não ocorre de forma adequada, principalmente da fase da puberdade em diante, (Figura 7) sendo assim, a hipófise e hipotálamo não sofrem inibição, produzindo ainda mais os hormônios luteinizante (LH) e (FSH). Os níveis elevados de FSH e LH ajudam a classificar o hipogonadismo da Síndrome de Klinefelter como primário, ou seja, incapacidade de os testículos responderem aos hormônios FSH e LH, não produzindo a testosterona. Ao contrário do hipogonadismo primário, o secundário é causado por alteração na função do hipotálamo e/ou hipófise e, consequente deficiência em outros hormônios desse circuito, como LH, FSH ou GnRH.
Papel da testosterona no sexo masculino
1. PERÍODO FETAL: A diferenciação entre sexo feminino e masculino ocorre da 7ª semana de gestação em diante, nesse período ocorre a diferenciação dos caracteres sexuais primários, relacionadas diretamente com o sistema reprodutor.
1.1 DESENVOLVIMENTO DOS ÓRGÃOS SEXUAIS MASCULINOS: durante o desenvolvimento do feto, o gene SRY, presente no cromossomo “Y” determinará a diferenciação das células de Leydig. Essas células irão produzir testosterona suficiente para induzir a formação das estruturas do sistema reprodutor masculino: epidídimos, ductos deferentes e das vesículas seminais. Durante esse estágio inicial (até a 12ª semana), a secreção de testosterona é regulada pelo hormônio peptídeo gonadotrófico (BHCG), produzido pela placenta. Embora essa fase dependa da testosterona, os indivíduos Klinefelter não apresentam grandes alterações durante o desenvolvimento inicial dos órgãos sexuais, isso porque a diminuição de células germinativas responsável pela diminuição de testosterona ocorre significativamente no período da puberdade em diante.
2. EFEITO NA DESCIDA DOS TESTÍCULOS: durante o desenvolvimento embrionário dos testículos, eles se encontram na cavidade abdominal e geralmente ocorre a descida para o saco escrotal durante os últimos 2 a 3 meses de gestação, quando começam a secretar quantidades razoáveis de testosterona, em especial a di-hidrotestoterona (Tabela 5) é a responsável por esse processo.
3. PUBERDADE: a puberdade consiste no aparecimento dos caracteres sexuais secundários e nas mudanças no processo de crescimento e composição corporal. Esse processo está inteiramente ligado a cascata de regulação dos hormônios sexuais masculinos, e sofre influência de: fatores genéticos, raciais, ambientais, sociais (erotização precoce), peso corporal e possíveis doenças presentes. No sexo masculino é esperado que a puberdade se inicie dentre os 9 a 14 anos.
O que determina o início da puberdade?
A produção do hormônio gonadotrofina (GnRH) é controlada pela concentração dos hormônios sexuais, ou seja, grande quantidade de hormônios sexuais inibe a produção e liberação de GnRH, enquanto baixas concentrações ativam a sua secreção (feedback negativo).
Porém, essa percepção de “grande quantidade” varia ao longo do desenvolvimento do sexo masculino. Durante a vida intra-útero, é necessária uma quantidade “X” de hormônios sexuais para inibir a liberação de GnRH, enquanto, que no início da puberdade é necessária uma concentração de “1000 X” para conseguir realizar a inibição. A consequência disso é que os hormônios gonadais (LH e FSH) aumentam progressivamente, atingindo altas concentrações e sem sofrer o efeito do feedback negativo, desencadeiam o aparecimento dos caracteres sexuais secundários quando a testosterona atinge sua concentração máxima (púbere) (Figura 8). É esse evento o precursor da puberdade.

Figura 8: Representação dos níveis de testosterona, ao longo das fases (fetal, neonatal, puberdade, adulto) do indivíduo de sexo masculino.
Eventos da puberdade no sexo masculino
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O primeiro sinal da puberdade no menino é o aumento do testículo. Ao nascer o testículo do menino apresenta cerca de 2ml, com um ano de idade sofre uma redução fisiológica para 1mL, permanecendo assim até o início da puberdade, entre 11 e 13 anos. O volume de aproximadamente 4mL é considerada a marca de início da puberdade masculina. Ao longo desse período, é esperado que o volume dos testículos chegue a 10/12mL (meio da puberdade) e atinja 20 a 25 mL até a fase adulta.
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Aumento do pênis: o crescimento do pênis varia de acordo com a idade, ele cresce do nascimento até os 4 anos de idade, e então permanece sem sofrer modificação até o início da puberdade. A média final é de 13 cm.
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Pubarca: corresponde ao surgimento dos pelos púbicos ou axilares. Ocorre por volta de 12 anos. O desenvolvimento dessa alteração é acompanhado pela Escala de Tanner que classifica a evolução da pubarca de acordo com a localização e características dos pelos.
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Espermarca: capacidade de produzir e ejacular espermatozoides.
Demais funções da testosterona no sexo masculino
Distribuição dos pelos corporais: testosterona induz o crescimento de pelos no púbis, no abdome, na face, tórax e, menos frequentemente em outras regiões do corpo como as costas. Além disso, o hormônio atua no aumento da quantidade dos pelos de outras partes do corpo, não tão abundantes no sexo feminino.
Calvície: reduz o crescimento de cabelos no topo da cabeça. Não é uma regra que o homem será calvo, já que a calvície é resultado de dois fatores: herança genética para o seu desenvolvimento e segundo, grande quantidade de hormônios androgênicos.
Voz: testosterona secretada pelos testículos produz hipertrofia da mucosa laríngea, tecido de revestimento interno dessa cavidade, e alargamento da laringe. Isso faz com que a voz fique inicialmente “rachada”, mas gradualmente, se transforma na voz masculina típica do adulto.
Pele: a testosterona aumenta a espessura de pele de todo o corpo, assim como a rigidez dos tecidos que a formam. Também é responsável por aumentar a secreção das glândulas sebáceas do corpo, encarregadas de produzir e liberar uma matéria oleosa, o sebo. Essa secreção excessiva é um dos fatores desencadeadores da acne, uma das características mais comuns da adolescência masculina.
Formação de proteínas e desenvolvimento muscular: o sexo masculino tem um aumento de cerca de 50% de massa muscular após a puberdade, em relação às meninas. Isso está associado ao aumento da quantidade de proteína, também em outras regiões do corpo, não somente nos músculos.
Matriz óssea: define-se matriz óssea como o material presente dentro do osso, que está em constante manutenção pelo nosso corpo, para que a quantidade de substâncias e nutrientes presentes na matriz seja suficiente para manter as células do tecido ósseo. O aumento da testosterona circulante leva ao crescimento e espessamento dos ossos, que recebem grandes quantidade de sais de cálcio. A testosterona promove a retenção de cálcio no osso.
Pelve: estrutura formada pelos dois ossos do quadril, nela a testosterona é responsável pelo estreitamento da passagem pélvica, ao contrário da pelve feminina que apresenta formado largo e ovoide, aumento da força da pelve.
Estatura: O estradiol (Tabela 1), molécula derivada da testosterona, está envolvida na junção das epífises (extremidades) dos ossos do corpo, processo que ocorre durante o crescimento e que provoca o aumento na altura do indivíduo. Em casos de grande produção deste hormônio, por exemplo, por mais que o crescimento ósseo aumente acentuadamente, a junção das epífises ocorre precocemente, impedindo que a pessoa atinja a altura que ela teria, caso a testosterona não tivesse sido secretada.
Aumento do metabolismo basal: define-se metabolismo como o conjunto de reações que ocorrem no organismo que equilibram as atividades em que gastamos e produzimos energia. Isso faz com que a atividade de todas as células do corpo aumente.
Aumento no número de hemácias: hemácias correspondem às células do sangue, responsáveis pelo transporte de oxigênio pelo organismo, o hormônio da testosterona aumenta a quantidade dessas células.
As funções da testosterona mencionadas, são também realizadas por moléculas convertidas a partir da testosterona, como Di-hidrotestosterona (DHT) e em Estradiol. A tabela 1 descreve as principais ações de cada uma dessas moléculas comparativamente com a testosterona.
Tabela 1: Principais ações da testosterona, di-hidrotestoterona e do estradiol
