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Cromossomos sexuais
                                                                                                                        Rafael Machado e Michelle Susin

           Como discutido na sessão sobre os cromossomos, os 46 cromossomos humanos são agrupados em 2 pares de cromossomos homólogos, dessa forma temos dois cromossomos que compartilham os mesmos genes (porém podendo apresentar alelos diferentes). Isso se aplica para os 22 primeiros pares, porém o par 23, os cromossomos sexuais, são diferentes.

            Assim como visto  os cromossomos sexuais são: O cromossomo X e o cromossomo Y. Sendo, normalmente, XX no sexo feminino e XY no sexo masculino. Esses cromossomos são diferentes um do outro, o cromossomo X é muito maior que o Y, tendo em torno de 649 genes, grande número quando comparado com os cerca de 40 genes presente no Y (Figura 1).

Esses genes dos cromossomos sexuais podem ser divididos em: Genes exclusivos do X, genes exclusivos do Y e os genes compartilhados pelo X e Y (genes da região pseudoautossomica) (Figura 2). Ou seja, embora muito diferentes os dois cromossomos ainda compartilham 17 genes entre eles.

O cromossomo Y: Por que os portadores de Klinefelter mesmo tendo dois cromossomos X ainda nascem homens?
                                                                                                                           Rafael Machado e Michelle Susin

        Os portadores da síndrome mesmo apresentando o mesmo número (ou mais) de cromossomos X que mulheres, eles sempre nascem do sexo masculino. Isso acontece pela presença do cromossomo Y, que dentro de seus genes exclusivos, está o gene SRY (Sex-Determining Region of Y Chromossome) (Figura 1), esse gene é o responsável pela determinação do sexo masculino, ou seja, a presença de cromossomo Y garante que o indivíduo seja do sexo masculino. Por isso os portadores da Síndrome de Klinefelter (SK), mesmo apresentando dois ou mais cromossomos X ainda sim correspondem ao sexo masculino. 

Por volta da 6ª semana de gestação inicia-se a formação do sistema reprodutivo, inicialmente é formado um par de gônadas primitivas, estrutura embrionária capaz gerar os ovários ou os testículos. Na ausência do SRY, ou seja, em indivíduos do sexo feminino, essa estrutura formará os ovários, entretanto na presença do fator determinante testicular (TDF), produto do gene SRY, elas formarão os testículos. Dessa forma o gene SRY, exclusivo do cromossomo Y, inibe o desenvolvimento ovariano e estimula a formação dos testículos, assim garantindo que o indivíduo seja do sexo masculino.

            Após a formação dos testículos nos homens, a secreção de testosterona inicia o desenvolvimento de características sexuais masculinas. A testosterona é um hormônio que se liga a receptores de andrógenos em muitos tipos de células para formar o corpo masculino.

Figura 1 (cromossomos sexuais).png

Figura 1. Cromossomo sexuais e a quantidade aproximada de seus genes. Cromossomo X (em azul) e cromossomo Y (em verde) com seu gene SRY destacado em laranja.

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Figura 2. Genes compartilhados e exclusivos entre os cromossomos sexuais. Os genes compartilhados entre eles (em laranja) localizados nas extremidades dos cromossomos.

Inativação do cromossomo X
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      Na presença de mais de um cromossomo X, um desses cromossomos é inativado aleatoriamente, dessa forma, em um indivíduo XX apenas um desse cromossomos X estará ativado. Isso ocorre para que mulheres não apresentem o dobro de alelos do cromossomo X ativos, quando comparados com indivíduos que apresentam apenas um X. Assim como em mulheres, portadores de SK (XXY) apresentarão um cromossomo X inativado (Figura 4). Esse cromossomo X inativado se compacta no núcleo, mudando sua conformação que então é denominada de corpúsculo de Barr. (Figura 3).

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Figura 3.  Formação do Corpúsculo de Barr. O cromossomo X inativo é condensado formando o corpúsculo de Barr.

Figura 4 (Cromossomos sexuais).png

Figura 4. Cromossomos sexuais no homem (XY), mulher (XX) e Portador de Klinefelter (XXY) após inativação do cromossomo X. Tanto na mulher quanto no portador de Klinefelter o segundo cromossomo X é inativado e forma o corpúsculo de Barr. Porém no portador da síndrome, assim como no homem XY, há a presença do cromossomo Y.

Como ocorre essa inativação do cromossomo X?
                                                                                                            Rafael Machado e Michelle Susin

   O processo de inativação do cromossomo X é dependente de um locus denominado centro de inativação do cromossomo X – denominado XIC. O primeiro passo desse processo é a expressão de um gene denominado XIST, responsável por desencadear o silenciamento ou inativação desse cromossomo. XIST irá gerar um RNA de fita única que serve como ancora para as proteínas que silenciarão o cromossomo. Há ainda outros mecanismos e genes envolvidos nesse processo, como o TSIX, que funciona como fita complementar do XIST, permitindo o funcionamento desse. Como mencionado, o gene XIST induz a inativação do X em células embrionárias, mas não é capaz de induzir o processo de inativação em células somáticas (Figura 5). Esse processo que se inicia na vida embrionária, deve ser mantido através de mecanismos específicos de manutenção de inativação nas linhadas celulares subsequentes.

Figura 5 (cromossomos sexuais).png

Figura 5.  Processo de inativação do cromossomo X. A inativação do X é feita pelo XIC (centro de inativação do cromossmo X) que contém o gene XIST. Na presença de outro cromossomo X, um deles terá XIST ativo que então irá silenciar os outros genes do cromossomo, tornando o cromossomo inativado.

Genes que escapam a inativação do cromossomo X.
                                                                                                                        Rafael Machado e Michelle Susin

    A inativação do cromossomo X não é completa, existem genes que mesmo estando no cromossomo X inativado (Xi) são expressos. Isso ocorre para manter um número de alelos nos cromossomos sexuais próximo de igual entre homens (XY) e mulheres (XX).

Figura 6 (cromossomos sexuais).png

Figura 6. Genes compartilhados entre o cromossomo X e Y podem escapar inativação do X. No homem XY (à direita) os genes compartilhados pelos dois cromossomos (em laranja) apresentam 2 alelos. Com o objetivo de manter a mesma quantidade de alelos ativos na mulher e no homem, alguns genes dessa região podem escapar a inativação no segundo X.

    Considerando que existem genes compartilhados pelos dois cromossomos, esses devem estar expressos em ambos os cromossomos X para que tenham dois alelos capazes de gerar produto, assim como em XY, sendo que no homem um deles é proveniente do X e um do Y e na mulher um proveniente do X não inativado e o outro do Xi (Figura 6).

      Entretanto não são apenas esses genes (os compartilhados entre X e Y) que escapam inativação em Xi. Existem genes exclusivos ao cromossomo X que são capazes de ser expressos, em algumas células, tanto no cromossomo X não inativado quanto no Xi. Dessa forma, mesmo com a inativação do X, mulheres (ou outros indivíduos com mais de um X) apresentam mais de um alelo ativo em genes exclusivos do cromossomo X (Figura 7).

     Isso é responsável por alguns fenótipos presentes em mulheres que não estão presentes em homens XY. Como é o caso de genes como o TLR7, que codifica uma proteína do sistema imunológico, como esse gene escapa a inativação as mulheres apresentam dois alelos que consequentemente gera mais transcrição de TLR7 por efeito de dose. Isso é um dos responsáveis pelas mulheres apresentarem maior resistência a infecção, porém com maior chance de desenvolver doenças autoimunes quando comparadas com indivíduos XY.

Figura 7 (cromossomos sexuais).png

Figura 7.  Localização dos genes que comumente escapam inativação do cromossomo X. Além dos genes que são compartilhados entre ambos os cromossomos sexuais, genes exclusivos ao cromossomo X também são capazes de escapar inativação.

Inativação do cromossomo X na Síndrome de Klinefelter.
                                                                Rafael Machado e Michelle Susin                

       Na SK assim como nas mulheres, a presença de dois (ou mais) cromossomos X levam à inibição de um deles. Esse Xi também apresentará genes capazes de escapar a inativação e esses genes que apresentam um alelo expresso a mais quando comparado com homens XY é um dos principais mecanismos genéticos da SK. A Figura 8 apresenta alguns exemplos desses genes que escapam a inativação, suas funções e possíveis consequências na síndrome de Klinefelter.

Figura 8 (cromossomos sexuais).png

Figura 8.  Exemplos de genes capazes de escapar inativação do cromossomo X na Síndrome de Klinefelter. Localização dos genes capazes de escapar inativação (à esquerda), suas funções (no centro) e possíveis consequências de apresentar um alelo “ativo” extra desses genes na síndrome de Klinefelter.

         Um desses exemplos é o gene GTPBP6, foi observado que  expresso em maior quantidade está relacionado com maior dificuldade no desenvolvimento da linguagem. O GTPBP6 (GTP binding protein 6) ainda não tem sua função completamente entendida, mas se sabe que codifica uma proteína que participa de sinalizações celulares (mecanismo molecular que permite comunicação entre células coordenando as atividades e funções celulares) e é expresso em múltiplas regiões no cérebro, tanto no adulto quanto no feto. Considerando isso acredita-se que esse gene possa estar relacionado tanto no desenvolvimento da capacidade de comunicação quanto na sua função no adulto.

            Outro que também é exemplo de genes que escapam inativação de cromossomo X e consequentemente gera uma manifestação na síndrome de Klinefelter é o SHOX (short stature homeobox). Esse gene é um dos que tem papel melhor entendido na SK. Ele codifica uma proteína relacionada com crescimento de ossos longos, dessa forma quanto mais expresso o SHOX maior será a altura final do indivíduo. Como os indivíduos na SK apresentam uma cópia a mais do X e esse gene é capaz de escapar a inativação, os portadores da síndrome apresentam uma estatura final maior que a média masculina.

            O CSF2RA (Colony Stimulating Factor 2 Receptor Alpha) é responsável pela síntese de um receptor relacionado com a formação e diferenciação de células do sistema imunológico chamadas macrófagos. Foi observado que indivíduos com expressão aumentada desse gene (como os portadores de SK) apresentam maior incidência de obesidade e diabetes tipo II (Diabetes por resistência à insulina). Nessa doença o indivíduo desenvolve diabetes devido principalmente a obesidade, que junto com outros fatores gera um estado inflamatório responsável pela resistência ao hormônio insulina, ou seja, apesar de apresentar insulina ainda apresenta dificuldade do controle de glicose no sangue. A ligação entre a cópia extra de CSF2RA e a diabetes tipo II ainda não é bem descrita, porém é possível supor que o estado inflamatório e a maior ação de macrófagos estejam relacionados.

Outra conexão entre genes capazes de escapar inativação e a síndrome de Klinefelter seria o fato de que homens portadores apresentam a mesma chance de desenvolver doenças autoimune (condições em que o sistema imunológico ataca células do próprio indivíduo) do que mulheres XX, embora as chances de desenvolver doenças como lúpus eritematoso sistémico sejam cerca de 10:1 quando comparados mulheres XX com homens XY. Isso ocorre devido a presença de genes do sistema imunológico dentro dos capazes de escapar inativação no cromossomo X, como o gene TLR7 discutido anteriormente.

            Porém esses genes capazes de escapar a inativação apresentam maior variação em SK do que em mulheres XX, ou seja, outros genes além dos que mais comumente escapam ativação em mulheres podem ser expressos mesmo em Xi em Klinefelter. Essa variabilidade dos genes capazes de escapar inativação em X é umas das razões pela grande diferença de fenótipo dentro de SK, isso pois o gene que escapa ativação em um tipo celular em um indivíduo pode não ser expresso em outro.

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